sábado, 15 de dezembro de 2012

Hermes e Renato




Uma rápida?

Em vários livros que já li, o inferno é descrito praticamente sempre da mesma forma:

Um lugar horrível, repleto de ruídos insuportáveis, odor desagradável, pessoas derretendo, carregando pesos, sentindo dor, medo, humilhação, vergonha, cercados de caras feias, sofrimento, olhos lacrimejantes, gritos aterrorizantes, corpos nojentos e suados, monstros, barulho de ferro, vaidade extrema e luxúria.

Já eu, chamo de academia de ginástica.

- “Amor, vambora!”
- Já vou! Só um momento.
- “Você já se olhou no espelho vinte vezes.”
- Reparou como eu fico bem com esse tênis?

Comprei um tênis de corrida.

- “Tchau! Vou malhar na academia mesmo!”
- Poxa, mas você sabe que...
- “Tchau.”
-... não posso entrar lá.

Não entro em academia.
 Um, dois, três pé de pato, mangalô três vezes!

- Então, tá! Vou correr na praia mesmo!

Gritei para a porta.

Nunca vi muita objetividade em correr se não fosse para pegar o ônibus.
Mas até que correr na praia é legal.
O visual, o clima, o ar quase puro...

Estou correndo no momento.

É engraçado como às vezes a gente passa a vida sem conhecer o próprio corpo, né?
Eu por exemplo, descobri que corro muito bem.
Meu único problema é respirar enquanto faço isso.

Estou cansado no momento.

- “Cansou moreno?”

Nem a voz feminina me fez levantar a cabeça e os olhos, muito menos tirar as mãos dos joelhos.

- Não... eu... só... é só uma dor na coxa.

Mentira! Estava sem ar mesmo.
No dia anterior, a pessoa bebe igual puta de folga.
No outro dia quer correr.
O álcool fermenta, borbulha no estômago e espuma pela boca.

- “Você se alongou?”
- Hummm... não. Mas já está melhorando

Quando comecei a correr, tive que traçar um plano fajuto na minha cabeça, só para me distrair.
Eu descanso, mas se passar um velho ou uma mulher perto de mim correndo, tenho que manter o ritmo deles.

- “Então vamos lá?”

A mulher parou do meu lado e ficou correndo sem sair do lugar, feito um brinquedo de camelô.

Era uma coroa bonita.
Parecia a Vó da Polly.
Com tudo em cima.
Cabelo, silicone e botox.
Toda montada nessas roupas de ginástica.
Vamos combinar que as roupas de ginástica que as mulheres usam é um caso á parte! Diz que não?
O tênis era impecavelmente branco. Novo como se ela tivesse um para cada dia do ano.
A meia grossa, ia até as costas do joelho.
A calça era rosa choque camuflada, rajada de roxo e amarelo, como se a Isabelita dos patins fosse dos Comandos em Ação.
Top preto, toalhinha amarela e viseira.
No braço, o que parecia ser um relógio de maneta, era um marcador de batimentos cardíacos.

- “Vamos moreno?”

Sabe-se lá o porquê, ela simpatizou comigo.
Quer dizer... eu sei porque... sou fofo e charmoso.

Não ia deixar a Vó da Polly, cheia de disposição, tirar uma onda com a minha cara, né?

- Vamos lá!

Ela tinha ritmo e estava a fim de conversar.
Eu tinha gases e só dizia: É!

Reparando as pessoas curiosas que passavam correndo.

Tem aquela gostosona de bunda grande que corre em câmera lenta como se estivesse num concurso de bunda mais bonita da cidade.
E o cara musculoso que jura que faz parte da Liga da Justiça indo salvar o planeta.
O gay apertado na lycra, sem um pêlo no corpo sequer que corre como se quisesse fazer xixi.
O velhinho tarado com torcicolo que nem corre, só quer ver a mulherada.
Tem aqueles que correm tentando alcançar a autoestima.
Tem o suado derretido que corre esbaforido como se um Javali o perseguisse.
Os maratonistas, atletas e lutadores.
E é claro... A maioria que só quer emagrecer mesmo...

Existem pelo menos cinco coisas que emagrecem comprovadamente:
Chifre, doença, sibutramina, crack e corrida.

Melhor correr!

- “Vai subir?”

Han?

- Han?
- “Vai subir correndo?”

Tinha até esquecido da Vovó Polly ao meu lado.

Subir correndo...
No fim da praia tem uma “montanha” gigante que dá num Museu muito maneiro inclusive, em forma de disco voador, criado pelo finado Oscar Niemeyer.

Estranho falar isso... Finado Niemeyer...fi-na-do-Ni-e-mey...
Enfim...

E eu estava de ressaca.
Só queria fazer um Cooperzinho para ficar de cooper feito..
E descobri que não usam mais essa palavra, muito menos a piada.
Foda-se.
Devo nada para essa coroa...
Mulher chata, cheio de fôlego ainda.

- Vou subir não.

E desabei.
Ok... Ela me venceu, deve tomar chá com esteroides.

- “Vamos caminhando então?”

Porra...
Ela parecia uma mistura de personal trainner com aquele pessoal que dá sopa para mendigo?
Estava querendo me ajudar.

- Hummmmmm... É que...
- “Só para gente concluir.”
- Tá.

Subimos o elevado andando.

De repente a porra do bipzinho cardíaco da coroa estava apitando mais que o Wolverine na porta do banco.

- Tudo bem?

Ela foi desfalecendo feito boneco de cera em sauna.

- Xi.....

Esse negócio de ser saudável, às vezes faz mal para saúde.

Sentei a Vovó da Polly no banco.
Conta comigo. Um negro correndo no calçadão da zona sul atracado com uma loira... dou-lhe uma, dou-lhe duas...
Rapidamente várias pessoas apareceram para ajudar com copos d’águas e leques.

Como não sou médico, nem parente, nem escoteiro, nem bonzinho.
Fui embora.

Continuei subindo.
Até comecei a correr de novo.
A vista é muito bonita.
Infinitamente mais prazeroso do que correr em esteira de academia.
Um, dois, três, pé de pato, mangalô, três vezes!

Lá de cima você vislumbra todo o horizonte.
É bem alto.
Seria uma queda e tanto nas pedras se alguém por descui...

Mermão...
Tomei-lhe uma porrada na nuca de algum animal voador...

“PAH!”

Escorreguei e quase caí do penhasco. Quase mesmo!

O cu travou igual discussão de gagos.

- Que porra é essa?

Primeiro achei que tinha sido atacado por um Pterodátilo.
Mas como não tem ninho deles ali por perto...

 Depois percebi que o bicho agonizando no chão, fazendo ruídos estranhos era um avião.

Tal qual o WTC fui atacado por uma porra de um aviãozinho desses de aeromodelismo.

Machucou.

Aí vem descendo o Bin Laden com o controle na mão.

- “Ô, meu amigo, me desculpa!”

Não.

- “Me descuidei.”
- O problema é que eu quase caí, lá embaixo. Tem que tomar cuidado. E se fosse uma criança?

Dei um esporro com minha voz de esporro.

- “Claro, claro... você tem razão.  Qual o seu nome?
- Angelo Morse.
- O meu é Renato, vou te pagar uma água de côco pelo incidente.”
- Não precisa.
- “Faço questão.”

O avião era maneiro, grande, bonito e vermelho.

Renato mexia no aviãozinho com a delicadeza de um ginecologista e a paixão de um Romeu.
Acariciava como se fosse uma criança.

- Graça a Deus, foi só um arranhão na asa esquerda.

E outro no meu pescoço.

- Como funciona?
- “É tudo pelo controle.”
- Hummmmmmmmmmmmmmm...
- “Quer ver?”
- Sim, sim.

Maneiríssimo o aviãozinho mesmo!
Fazia as acrobacias perfeitas e viajava ousadamente por cima da praia.

- Mas vem cá... E se ele cair na água?
- “Não cai.”
- Por que?
- “Porque não. Eu não deixo.”
- É... seria uma merda para pegar de volta.
- “Nem fala.”

E o aviãozinho voando sobre o mar.

- Mas você já viu algum cair na água?
- Nunca.

No momento exato que ele falou isso...

Acreditem ou não...

O avião caiu na água.

- “Puta que pariu!”
- Ih... rapaz...
- “Porra! Que boca!”
- E agora?

Renato sem reação olha o aviãozinho náufrago.
Ia dar um trabalho da porra para resgatar o brinquedo.

Como não sou bombeiro, nem salva vidas, nem amigo, nem bonzinho.
Fui embora.

Desci com um pecador sorrisinho "coringuesco" na cara.

Por via das dúvidas, resolvi correr.


Antes do fim do mundo sai outro.  Divulguem para mim...

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