sexta-feira, 2 de março de 2012

Pegou fogo no meu ônibus.


Assim como a maioria da população pós carnaval, estou mais pobre.

Fiquei tão duro que até minha conta do facebook está no vermelho.

Eu moro na Zona Sul, que é ao lado do Centro da cidade.

E eu precisava ir ao Centro.

No meu mundo ideal, no qual só eu tenho carro e olhos verdes, dá pra fazer esse percurso em quatro minutos.

No mundo legal, no qual outras pessoas também têm carros, daria pra fazer em 15 minutos.

Mas no mundo infernal, no qual o trânsito é insuportavelmente irritante, eu faço o mesmo caminho em 55 minutos.
Mais 15 minutos para achar uma vaga.

Ao contrário do que dizem, achar uma vaga no centro da cidade é muito simples:

Você só precisa achar alguém que esteja sinalizando que vai dar ré para fazer a balisa.
Aí você rapidamente pára atrás dele, sai do seu carro com um machado, golpeia a cabeça do motorista umas três ou quatro vezes, arrasta o corpo para fora do carro, joga atrás de uma banca de jornal, empurra o carro dele para frente, volta para o seu veículo e entra na vaga que era dele.

Ufa! Que sorte! Uma vaga!

Tudo isso, claro, sem deixar o guardinha de trânsito te multar.

Depois é só pagar 3 ou 30 ou R$ 3.000 para o flanelinha não riscar o seu carro todo e está tudo bem.

Deu uma preguiça.

Vou de ônibus.

Quando você se acostuma com carro, seja ele zero, semi usado ou mesmo caindo aos pedaços, nunca mais quer saber de andar de ônibus.

Ônibus é lento, ônibus é cheio, ônibus é quente, ônibus pega fogo, ônibus não tem!

Mas, fingindo que moro num país do primeiro mundo, vou pegar o transporte coletivo porque sei que é o mais correto a se fazer pelo bem do tráfego, da sociedade e do planeta Terra.

Este ano pretendo ser uma pessoa melhor.

E também precisava economizar.

Quando não existe uma fila indiana no ponto, fica um aglomerado de pessoas esperando o ônibus chegar.
Quando ele está vindo, você tem que dar uma de Chico Xavier e advinhar exatamente onde a porta de entrada vai parar.

"Oba! Vou sentado."

Parado no sinal eu percebo como esse lance de jogar limão evoluiu, né?

Na verdade fuderam com a porra dos moleques que faziam malabarismo com limão em troca de alguns trocados.

Como o desemprego só aumenta, o espaço do semáforo foi invadido pela galera do circo também.

Mermão!
Nesse sinal, tinha dois caras. Um em cima do outro, que por sua vez, estavam em cima de algo como um carretel gigante feito de madeira.
O de cima fazia malabarismo com três cones de trânsito, enquanto o de baixo cuspia fogo.

Porra!

E a cara dos moleques com os três limões na mão:

"Muito trabalho pra ganhar um real, melhor roubar!"

De repente sobem duas pessoas pela porta da frente:
Um cego e uma mulher muda.

A muda eu só fui descobri que era muda depois, claro.

-“Boa tarde! Eu podia estar roubando, eu podia estar matando...”

Grande coisa, qualquer um ali podia.

-“...Mas estou aqui pedindo sua colaboração.”

Isso pra mim soa como ameaça, mas tudo bem.

A receita é antiga:
Enquanto ele fica na frente mandando o vernáculo, a outra dá uma de Cheetara e em fração de segundos distribui uns papeizinhos com a breve história triste do cara e tal...

Independente de qualquer coisa dá pra ver que o cara passa dificuldades, então uns ajudam, outros não.

Neste dia eu era o “outros não.”

Saí de casa só para dar um pulo no Centro e voltar.
Não tinha dinheiro mesmo, pô!

-Não obrigado, hoje não dá!

Já me recusando a pegar o papelzinho.

Mermão, a moça muda me olhou com uma cara feia...

- “Mrfmmmm....”

Insistiu.

-Não quero, não, obrigado querida!

Eu não queria pegar a porra do papel. Que saco!

A muda gritou comigo.

- “MRFMMMM...”

Já foi meio constrangedor.

Olhei para o lado assim, sem graça, e vi que tinha um moleque me olhando.

Por que essas coisas acontecem comigo?

Eu sei, podia ter pego a porra do papel e acabado com a cena.

Mas...

- Já disse que não quero!

Falei um pouco mais alto.

Não é não em inglês, em francês, em alemão, em mandarim, em hebraico, em Libras e até em braille.

Sabe o que ela fez?

Botou a porra do papelzinho na minha perna e saiu.

Filha da....

Olhei para o moleque de novo.

Ele levantou a sobrancelha assim tipo Macaulay Culkin, sabe?

Aé?

Dei um peteleco no papel para o chão e me encostei no banco.

Na volta, ela vem recolhendo os papéis e a grana com os passageiros.

Quando chegou ao meu lado, a muda se abaixou devagar, pegou o papel do chão, olhou na minha cara, apertou os olhos e abriu a boca.

Mermão, chegou a escurecer...

Até fechei a mão preparando um Hadouken.

Palavrão é palavrão em inglês, em francês, em alemão, em mandarim, em hebraico, em Libras e até em braille.

-“MMMMMMRSMMMRSMMMRSMRSMMSMSMRSM”

Claro que ela estava me xingando.

Não satisfeito, comecei a bater boca com a muda.

-Eu avisei que não queria! Você não pode me obrigar! Você me respeita...

-“MMMMMMR! MMMRSMM! MRSMRSMMSMSMRSM”

Enfim...

Puta merda...

Aí o cego, que não é surdo nem nada, mandou essa:

-“Deixa Gorete, quem não quer ajudar não precisa. Deve estar precisando mais do que a gente. Mas lembre-se que ninguém sabe o dia de amanhã.”

Me jogou uma praga, o filho da puta!

Gorete ainda mandou um:

-“Hnam!”

Voltou para perto do homem igual um cão guia e desceram do ônibus.

Eu fiquei até tremendo, sabe?

Poxa...Olhei para o lado e alguma pessoas compartilharam comigo.

Cinco minuto depois. Ônibus lotado.

Uma senhora de uns setenta anos pára ao meu lado.
Em pé.

- Ô senhora, pode se sentar!

Levantei para senhora sentar, igual mamãe me ensinou.

- "Quem disse que eu quero sentar? Tá me chamando de velha?”

Pára tudo!

Qual é a possibilidade?

- Não senhora! Estou apenas cedendo o meu lugar para senhora!

Até gaguejei.

- “Não precisa, não! A “velha” aqui agüenta ficar em pé! O problema de vocês é achar que velho não presta para nada e blá blá blá...."

Botei a mão na cara assim...

Inacreditável.

Dei sinal.

- Motorista posso descer aqui?

Ia andar metade do caminho a pé no sol, mas era melhor...

- "Vai lá que hoje está brabo para o seu lado."


Motorista até riu.

- É mole?!

Desci do ônibus e ainda vi a velha falando pra caramba.

Se eu tivesse gasolina e fósforo botava fogo no ônibus.

3 comentários:

  1. kkkkkkk!!!! Angelo, aqui em sp tb tem um mudinho que vende adesivo no trem e faz a msm coisa q sua amiga mudinha... impagável essa sua aventura!

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  2. Oi, Angelo! Adorei seu blog! Seguindo e divulgando para os amigos! Faz tempo que eu não ria tanto.

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